
WORK IN PROCESS
Mergulhe no dia a dia das equipes da Processium por meio de uma série de entrevistas com quem está no comando dos nossos projetos. Uma imersão no saber-fazer, nas trajetórias e na paixão que dão vida à nossa empresa.
N°1 O laboratório de fermentação
Desde que entrou na Processium, em 2018, o PhD Renato Sano Coelho tem um objetivo claro: colocar a fermentação no centro dos processos industriais. Naturalmente, ele desempenhou um papel central na concepção do novo laboratório de fermentação, uma infraestrutura fundamental que marca uma etapa importante no desenvolvimento da empresa. Movido por uma paixão de longa data pelos bioprocessos e por uma visão clara do potencial das biotecnologias na transição para uma indústria mais sustentável, ele compartilha agora os bastidores deste projeto ambicioso e o que ele representa para o futuro da Processium.

Você pode nos contar, em linhas gerais, como foi a sua trajetória profissional?
Sou formado em Engenharia de Processos Alimentares e tenho mestrado em Engenharia de Processos Biotecnológicos pela Universidade de Campinas, no Brasil. Durante meu mestrado, projetei um bioprocesso para a produção de ácidos orgânicos, que foi posteriormente patenteado. Depois disso, trabalhei por alguns anos em uma empresa farmacêutica que fabricava produtos sensíveis à contaminação microbiana. Por fim, fiz um doutorado duplo entre o Brasil e a Holanda (TU-Delft) sobre fermentação para a produção de biocombustíveis a partir de microrganismos. Minha tese envolveu tanto biotecnologias como também processos de purificação de produtos.
Em 2018, fui contratado pela Processium do Brasil e, três anos depois, entrei para a equipe francesa. Naquela época, Pascal Rousseaux, o fundador da Processium, queria construir um laboratório de fermentação. Hoje, tenho a oportunidade de realmente voltar à fermentação, incluindo a fermentação experimental, o que é muito empolgante.
A Processium inaugurou seu laboratório de fermentação em janeiro de 2025. Qual foi a sua contribuição no projeto e na implementação dele?
Começamos a falar sobre isso no final de 2023, após a aquisição da Processium pela Technip Energies. Recebemos uma meta de implementação para o novo laboratório em janeiro de 2024 e começamos a trabalhar nela imediatamente. Graças à minha experiência anterior, contribuí muito para o projeto desse laboratório, a escolha dos equipamentos, o recrutamento de técnicos… Meu conhecimento da área me ajudou a saber o que era necessário para esse laboratório, principalmente no que diz respeito à contaminação microbiológica – dos operadores, do ambiente ou dos produtos – que é a principal área de preocupação.
Você pode nos contar mais sobre como esse laboratório foi pensado?
Esse laboratório foi projetado para se adaptar às necessidades de fermentação e aos projetos da Technip Energies, mas não estávamos partindo de uma folha de papel em branco. Tivemos que transformar um laboratório (originalmente projetado para processos químicos) em um laboratório de fermentação, onde é essencial trabalhar sem deixar passar contaminantes microbiológicos (de fora para dentro e de dentro para fora), e esse não era o caso. Assim, tivemos que repensar o sistema elétrico, o tratamento de ar e água, etc.
Já estamos pensando em outros equipamentos que possam atender às necessidades emergentes do mercado. A demanda está sempre crescendo, portanto, cabe a nós nos equiparmos agora para atender a todas as necessidades específicas que surgirão nos próximos anos.
Falando especificamente de equipamentos e tecnologias, o que encontramos nesse laboratório?
Há três fermentadores de 5L e dois fermentadores de 30L. São uma espécie de tanques hermeticamente fechados, equipados com pequenos motores – porque os organismos precisam de agitação e aeração – e sondas específicas para monitorar as condições de cultura on-line e em tempo real: pH, temperatura, níveis de oxigênio etc. Também há várias autoclaves no laboratório para esterilizar qualquer coisa que possa entrar em contato com o produto. Também instalamos uma capela de segurança microbiológica, especialmente projetada para o manuseio de organismos geneticamente modificados. Ela nos permite criar um espaço de trabalho livre de contaminação e também filtra o ar de exaustão para evitar qualquer vazamento de microrganismos no ambiente. É importante lembrar que nós mesmos somos uma
Além da concepção e dos equipamentos, como esse novo laboratório fortalece a capacidade da Processium em pesquisa e desenvolvimento de novos processos industriais?
A fermentação era, até então, uma peça que faltava em nosso modelo e em nossa oferta de serviços. Este novo laboratório agora desempenha um papel essencial para a Processium, pois funciona como um elo entre os projetos, permitindo que avancemos ainda mais no desenvolvimento de processos cada vez mais completos, até o produto final.
Uma parte significativa dos projetos da Processium está ligada à biotecnologia e à purificação de produtos de fermentação. No entanto, até recentemente, diversas limitações restringiam nossa atuação. Por exemplo, alguns clientes desenvolviam a fermentação em pequena escala, o que raramente era suficiente para validar o processo ou trabalhar de forma eficaz na purificação. Com este novo laboratório, agora podemos oferecer a possibilidade de produzir amostras de até 30 litros diretamente em nosso fermentador, utilizando a própria cepa do cliente.
Dá pra perceber que esse projeto foi marcante para você. O que mais te entusiasmou ou motivou nesse trabalho com o laboratório de fermentação?
Acho que sempre tive uma certa paixão pela biotecnologia porque acho fascinante o fato de um processo usar organismos vivos que não foram feitos para isso, mas que, com a ciência, podem ser usados de uma maneira muito específica e eficaz. É empolgante poder controlar esses organismos para produzir riqueza para a sociedade. Há muito trabalho por trás disso, mas é realmente empolgante.
Para este projeto em particular, acho muito interessante poder participar da criação do laboratório desde o início. Isso é muito raro porque, em geral, nós nos adaptamos ao laboratório existente. Projetar um laboratório totalmente novo significa que você pode começar da melhor maneira possível e, é claro, mal posso esperar para vê-lo evoluir.
Esse laboratório já mostra uma certa visão de futuro. Na sua opinião, para onde caminham os processos de fermentação?
A fermentação tem se tornado um tema cada vez mais central no desenvolvimento de processos sustentáveis, pois oferece uma alternativa viável às rotas baseadas em combustíveis fósseis. Atualmente, a maioria dos produtos que usamos — plásticos, materiais, combustíveis — ainda é derivada do petróleo, mas com a urgência da crise climática, é fundamental encontrar outras soluções rapidamente.
Além disso, a fermentação apresenta importantes vantagens ambientais. Ao contrário das reações químicas tradicionais, que exigem condições extremas — altas temperaturas e pressões —, os micro-organismos operam em condições semelhantes às nossas. Por isso, os processos fermentativos funcionam em ambientes muito menos exigentes, o que pode resultar em economias significativas de energia.
Existe também a ideia equivocada de que os processos bioquímicos são sempre menos eficientes que os convencionais, mas isso nem sempre é verdade. Os processos derivados do petróleo se beneficiaram de décadas de investimentos e experiência, o que os torna mais competitivos atualmente. Estou certo de que isso vai mudar nos próximos anos, mas é preciso conscientizar o público.
Na minha opinião, a fermentação se tornará um processo fundamental no futuro próximo, especialmente com os avanços da inteligência artificial. Já existem ferramentas impulsionadas por IA capazes de descobrir novos produtos biotecnológicos muito promissores — como moléculas com efeitos aprimorados para o desenvolvimento de medicamentos, por exemplo.
Vamos lá, última pergunta — e não é das mais fáceis: se uma criança te perguntasse o que é fermentação, como você explicaria?
Vamos pensar nos microrganismos como pequenos animais que precisam ser alimentados. Eles precisam de uma dieta balanceada para serem saudáveis e poderem crescer. Assim como quando alimentamos as vacas com uma dieta balanceada para que elas produzam um leite melhor. Os microrganismos são a mesma coisa: nós os colocamos em uma cultura e os alimentamos adequadamente para que possamos colher novos produtos de interesse. Um processo de fermentação é como um pequeno agricultor de laboratório de alta tecnologia.